Era feito de esperas,
desde o começo do mundo.
Vagueava ao sabor das águas,
levado pelos ventos,
dobrado sob o peso das incertezas
com que alimentava os dias,
partilhava as noites com os fantasmas
dos meus medos
que ferozes me iam desventrando
as memórias
até só restarem imagens dispersas,
incoerentes.
Viajava sem rumo,
entregue
ao silêncio como se a minha vida
fosse um filme mudo,
a que assistia apático,
indiferente.
Só a transcendente vertigem da tua voz
me consentiu que roubasse aos deuses
a luz dos dias e capacidade de ressuscitar
o majestoso murmúrio do tempo.
António Patrício