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Confesso
que me canso
da imobilidade das estátuas
do voo errático dos pássaros
dos dias de Sol… e dos de chuva também.
Canso-me das multidões de riso ausente
e da barulheira infernal do silêncio.
Canso-me dos cães que falam
das pessoas que ladram esganiçadas incongruências
cuspidas à mesa de um café
com restos de pastel de nata entre os dentes.
E dos almoços felizes de famílias
destroçadas onde se arrota uma espécie felicidade
entre copos de tinto? Como me canso…

Canso-me dos beijos de última hora
palrados por charlatães a todas horas
em palavras tristes embrulhadas
em decadentes rimas
e dos amores prostituídos em versos azedos;
Canso-me dos livros que não li
das páginas a que sobrevivi em tempos de vida adiada
Das noites que me roubam o corpo e a voz…
De esperar pelo futuro que queria agora, inteiro
ao invés deste presente carregado de restos de um passado
povoado de memórias e sombras.
Canso-me de respirar o ar podre da cidade
que abre feridas no corpo,
degredo de carne que me reveste os ossos…

…canso-me até de me cansar.

António Patrício Pereira

fotografia / Raphael Guarino (Alemanha)